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O que é Responsabilidade Civil?
- Noções introdutórias: na linha de pensamento de José de Aguiar Dias, “toda manifestação humana traz em si o problema da responsabilidade”.
- A responsabilidade civil é um tipo de responsabilidade jurídica. Ocorre que a responsabilidade transcende o campo jurídico; é um problema do conhecimento humano, repercutindo em várias esferas (moral, religiosa, etc.).
- Conceito de responsabilidade civil: a responsabilidade civil, espécie de responsabilidade jurídica, deriva da transgressão de uma norma civil preexistente impondo-se ao causador do dano a consequente obrigação de indenizar.
- A depender da natureza jurídica norma civil preexistente violada a responsabilidade poderá ser:
- A CONTRATUAL (quando a norma agredida tiver natureza negocial – arts. 389 e seguintes e arts. 395 e seguintes do CC); e
- A EXTRACONTRATUAL ou AQUILIANA (quando a norma agredida tiver natureza legal – arts. 186, 187 e 927 do CC).
- OBS.: qual a diferença entre ilícito penal e ilícito civil? Durante anos a doutrina se digladiou tentando cunhar a diferença entre ilícito civil e ilícito penal. Na linha de pensamento de alguns autores, como Miguel Fenech e Aguiar Dias, podemos concluir que a diferença está basicamente na carga sancionatória estatal e na tipicidade exigida para a responsabilidade penal.
- Sistema positivo de responsabilidade civil: a despeito de o CC não conter tipos especiais como no Direito Penal, consagrou, todavia, um sistema normativo de responsabilidade calcado em três artigos fundamentais:
- O art. 186 do CC, pois ao definir o ato ilícito, consagra uma regra geral de responsabilidade civil complementada pelos artigos 187 (que define o abuso de direito) e 927 do CC. Em verdade, tal sistema visa a coibir comportamentos danosos em atenção ao princípio do NEMINEM LAEDERE (segundo o qual a ninguém é dado causar prejuízo a outrem). Obs.: fica no topo, pois define o ato ilícito. Não se trata de questão de hierarquia.
- Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária (dolosa), negligência ou imprudência (culposa), violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
- Este dispositivo consagra uma ilicitude subjetiva ou objetiva? Subjetiva (dolo e culpa). Contudo, além do art. 186 do CC, que firma o sistema de ilicitude subjetiva, integram também o sistema jurídico de responsabilidade civil extracontratual artigos que consagram formas de ilicitude objetiva (arts. 187 e 927 do CC).
- Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
- Em nenhum momento, o artigo supramencionado, ao definir abuso de direito citou dolo ou culpa, consoante mestre Daniel Boulos o dispositivo consagrou a chamada ilicitude objetiva, tendo em vista que para a aferição do abuso, não se analisa culpa ou dolo, senão a própria finalidade do agente (se ultrapassou ou não os limites ditados pelo fim social ou econômico, pela boa-fé ou bons costumes).
- Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
- Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
- O nosso sistema de responsabilidade, pois, é montado com base nesse tripé. O artigo acima ainda será mais aprofundado.
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Quais são os ELEMENTOS OU REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL?
- São três os elementos da responsabilidade civil:
- Conduta humana;
- Nexo de causalidade; e
- Dano ou prejuízo.
- OBS.: a CULPA, base da responsabilidade do CC da França (arts 1.382 e 1.383 e também do CC/16, não é um elemento obrigatório da responsabilidade civil uma vez que existe responsabilidade civil sem análise da culpa.
- 1. CONDUTA HUMANA: primeiro elemento da responsabilidade civil traduz o comportamento humano positivo ou negativo voluntário e consciente, causador do resultado danoso (vontade consciente – é a pedra de toque).
- Ex1: alunos jogam Fredie em cima de Pablo.
- Ex2: sonambulismo.
- Ex3: Bettiol, na obra “Direito Penal”, exemplifica situação em que não há conduta humana: o sujeito está no museu, passa a sofrer de hemorragia nasal e seu sangue jorra em quadro famoso.
- A conduta humana, para efeito de responsabilidade civil, pressupõe voluntariedade consciente na sua atuação omissiva ou comissiva.
- OBS.: levando em conta o rigor técnico, o primeiro elemento da responsabilidade civil, a conduta ilícita não é elemento da responsabilidade civil. Isso porque pode haver responsabilidade civil de ato lícito (consoante alguns autores, tais como: Garcez Neto, Windscheid e Paulo Lobo), muito embora na maioria das situações haja conduta ilícita. Assim, pode haver por EXCEÇÃO, responsabilidade civil decorrente de ato lícito. Exemplos:
- 1. Desapropriação; e
- 2. Passagem forçada do Direito de Vizinhança, na qual se deve indenizar o proprietário que sofre a passagem (atenção: a servidão é um direito constituído; a passagem é um direito que a lei concede ao proprietário que tem sua propriedade encravada).
- 2. NEXO DE CAUSALIDADE: no campo do Direito Penal, a teoria aplicada nessa seara é a Teoria da Equivalência dos Antecedentes, a qual é complementada pela Teoria da Imputação Objetiva.
- O nexo causal é o liame ou vínculo que une o agente ao resultado danoso.
- Fundamentalmente há três teorias no campo do Direito Civil:
- .TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES OU CONDIÇÕES (TEORIA DA CONDITIO SINE QUA NON): teoria desenvolvida por um jurista e filósofo alemão Von Buri. Para esta teoria, todo e qualquer antecedente fático que concorra para o resultado é causa. Contudo, por meio de tal teoria o intérprete pode ser levado a uma espiral infinita. Ex: crime VS chegar a Adão e Eva.
- .TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA: teoria desenvolvida pelo filósofo Von Kries. Para essa segunda teoria causa é apenas o antecedente que, segundo um juízo abstrato de probabilidade, seja apto ou idôneo a determinar o resultado danoso. Ex: a compra da arma não é a causa da morte de alguém (mas sim o disparo). Aqui analisa a causa mais adequada a chegar num resultado danoso.
- Ex: cidadão está no aeroporto aí entra alguém e vê o cara usando o vaso sanitário este último tira do bolso uma massa a fim de travar a porta. Em razão disso o cidadão perdeu o voo e embarcou noutro avião (o qual caiu e o cidadão por sua vez). O cara que usou a massinha deu causa a morte? Para a primeira teoria, na forma mais pura, o brincalhão deu causa. Contudo, segundo o juízo de experiência da vida – prender alguém num banheiro – não é a forma adequada a determinar a morte de alguém, linha de pensamento seguida por esta segunda teoria.
- .TEORIA DA CAUSALIDADE DIRETA E IMEDIATA: tal teoria foi desenvolvida no Brasil pelo professor Agostinho Alvim. Para esta terceira teoria, mais objetiva do que as anteriores, causa é o antecedente que determina o resultado danoso, como conseqüência sua direta e imediata.
- Gustavo Tepedino é defensor desta terceira teoria (RTDC – Revista Trimestral de Direito Civil - ano 2, V. 06/01), bem como Carlos Roberto Gonçalves, razão pela qual defendem ter sido esta a teoria adotada pelo Código Civil em seu art. 403. Vejamos:
- CC, Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.
- OBS.: todavia, esta matéria está longe de ser pacífica. Grande parte da doutrina, a exemplo de Sérgio Cavalhieri Filho e Romualdo dos Santos, a despeito da dicção do artigo 403 do CC, entendem que o CC adotou a Teoria da Causalidade Adequada. Em nosso pensar, entretanto, a teoria adotada foi a da Causalidade Direta e Imediata, o que encontra reforço no REsp 686 de 2008 do RJ da relatoria do Min. Luiz Fux, bem como no noticiário especial do STJ do dia 04 de maio de 2010.
- 3. DANO OU PREJUÍZO: nem todo dano é indenizável, ou seja, nem todo dano gera responsabilidade civil.
- Qual o conceito de dano no campo da responsabilidade civil?
- Dano traduz a lesão a um interesse jurídico tutelado patrimonial ou moral.
- Requisitos do dano indenizável:
- 1º Violação de interesse jurídico material ou moral. Ex: dor coração não viola interesse jurídico – término de namoro;
- 2º Subsistência do dano. Ex: se o dano já foi reparado, não há dano. Segundo MHD só se pode indenizar em juízo o dano que subsista; e
- 3º Certeza do dano. Não se indeniza dano hipotético, mero aborrecimento, mero dissabor – não se indenizam meras abstrações. O dano para ser indenizável deve ser certo.
- OBS.: mitiga este terceiro requisito a teoria francesa da perda de uma chance. Segundo o Prof. Fernando Gaburri a perda de uma chance pode ser indenizável por afastar uma legítima expectativa de favorecimento ao lesado.
- Ocorre nos casos em que se retira da vítima a provável oportunidade de melhorar a sua situação atual. Ex: candidato muito bem preparado perde o voo para a cidade onde iria realizar a última fase de um concurso, devido à paralisação por parte dos funcionários.
- Outros exemplos:
- Advogado que perde prazo de contestação em matéria favorável ao seu cliente x recurso deserto, pois o advogado não preparou o recurso (aprofundar no tema vide obra da editora LTR de Sérgio Novaes Dias denominada “Responsabilidade Civil do Advogado pela Perda de uma Chance”).
- Houve um REsp famoso que aplicou a Teoria da Perda de uma Chance: o REsp 788.459/BA consagra situação de perda de uma chance por conta da impropriedade de pergunta formulada em programa televisivo.
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O que se entende por dano reflexo (ou dano em ricochete)?
- Dano reflexo é aquele que atinge a vítima indireta, ligada a vítima direta da atuação ilícita. Temos duas vítimas aqui. Uma que sobre o dano direto e outra de forma secundária (em ricochete). Ex: criminoso arma de fogo disparou um tiro vítima 1 morreu vítima direta. Certo que a vítima 2 (filho da vítima n. 1) sofre um dano reflexo em razão da morte de seu pai. Trata-se de dano indenizável.
- OBS.: não confundir este dano com o que alguns autores chamam de danos INDIRETOS (Fernando Gaburri), caso em que a mesma vítima sofre uma “CADEIA DE PREJUÍZOS” (danos indiretos). Dano indireto remete-nos à ideia de uma cadeia de prejuízos: a mesma vítima sofre um dano direto e danos indiretos ou conseqüenciais. Ex: comprei um cavalo infectado, que transmite doença aos outros do estábulo; todos morrem.
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O que é dano in re ipsa?
- Esta expressão remete-nos à ideia do dano que pela sua gravidade ou reiteração dispensa prova em juízo (Ler REsp 775.766 do Paraná e REsp 357.404 do RJ).
- Empresa que não assiste uma empregada em momento de acidente do trabalho, p.ex.
- O dano moral, digo, a prova disso é dispensável. O que se discute é quantidade (a matemática).
- Outro caso em que o dano é presumido, isto é, em que se dispensa a prova do dano. Ex: negativação indevida no SPC e SERASA.
- OBS: o STJ tem entendimento no sentido de que “devedor com vários registros em cadastro de proteção ao crédito não tem direito a indenização por dano moral”. Por fim, cita a súmula 359 do STJ: Cabe ao órgão mantenedor do cadastro de proteção ao crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição.
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