Direito Penal geral

  1. Qual o conceito de Direito Penal sob o aspecto formal?
    Sob o aspecto formal, direito penal é um conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem aplicadas.
  2. Qual o conceito de Direito Penal sob o aspecto sociológico?
    • Sob o enfoque sociológico, Direito Penal é mais um instrumento de controle social de comportamentos desviados, visando assegurar a necessária disciplina social.
    • O Direito Penal é um dos ramos do direito, se diferenciando dos demais por sua conseqüência jurídica mais drástica, devendo ser utilizado como última razão. Somente se socorre ao direito penal, quando outros ramos do direito forem ineficazes para pacificação social. Ele não age no mesmo tempo, aguardando a atuação dos demais.
  3. O funcionalismo se divide em duas escolas:
    a) funcionalismo teleológico ou racional; b) funcionalismo sistêmico ou radical.
  4. O que diz o funcionalismo teleológico ou racional?
    Segundo o funcionalismo teleológico ou racional (Roxin), a função do direito penal é assegurar bens jurídicos indispensáveis, valendo-se das medidas de política criminal. Ele se vale de princípios positivados ou não, de política criminal, e, conseqüentemente, concorda com o princípio da insignificância (ex: furto de caneta é irrelevante).
  5. O que diz o funcionalismo sistêmico ou radical?
    Segundo o funcionalismo radical ou sistêmico (Jacobs), a função do direito penal é resguardar o sistema, a norma e o direito posto (o império da lei). Os sistêmicos não admitem princípios não-positivados, visto que não se encontram no ordenamento jurídico. Desse modo, não adotam o princípio da insignificância, pois se preocupam com a aplicação da norma, e não com o bem jurídico tutelado.
  6. Por que o funcionalismo sistêmico é chamado de direito penal do inimigo?
    • Para Jacobs, o agente que furta um veículo ou uma caneta, está ferindo o sistema da mesma forma. Ao ferir o sistema, o agente torna-se inimigo do sistema. Por isso é denominado Direito Penal do inimigo.
    • Já para Roxin, há irrelevância desta ação, se valendo de medidas de política criminal. Não prejudica de maneira intolerável o bem jurídico, logo, não é função do direito penal resguardar bens jurídicos irrelevantes.
  7. O que é direito penal objetivo?
    : é o conjunto de leis penais em vigor no país (ex: Código Penal).
  8. O que é direito penal subjetivo?
    : é o direito de punir do Estado.
  9. Quais são os limites ao direito de punir?
    • a) Limite temporal: exemplo clássico é a prescrição. Há duas exceções que são o crime de racismo e a atividade de grupo armado contra o Estado.
    • b) Limite espacial: princípio da territorialidade (art. 5º do CP), pois em regra, somente se punem fatos ocorridos no território nacional.
    • c) Limitação modal (limite quanto ao modo): princípio da dignidade da pessoa humana ou humanização das penas. Este limite não pode encontrar exceções.
  10. A APP é exceção ao direito de punir estatal? Existe alguma exceção?
    • A ação penal privada não é exceção ao direito de punir do Estado, uma vez que ao ofendido se transfere apenas a persecução penal, e não efetivamente o direito de punir.
    • O direito de punir é monopólio Estatal. Excepcionalmente, permite-se a aplicação de sanções penais pelos grupos tribais (índios), desde que respeitado o princípio da dignidade da pessoa humana, proibido em qualquer caso pena de caráter cruel ou infamante, ou pena de morte (art. 57 da Lei 6.001/73 - Estatuto do Índio). É o Estado respeitando os costumes e a cultura indígenas.
    • O Tribunal Penal Internacional, de que o Brasil é Estado-parte, não é uma exceção ao monopólio estatal do direito de punir.
    • O Tribunal Penal Internacional tem competência subsidiária em relação às jurisdições nacionais de seus Estados-partes. Consagrou-se o Princípio da Complementaridade, isto é, o Tribunal Penal Internacional não pode intervir indevidamente nos sistemas judiciais nacionais, salvo nos casos em que os Estados se mostrem incapazes ou não demonstrem efetiva vontade de punir os seus criminosos (resumo: intervém somente se e quando a justiça repressiva interna não funcione).
  11. Pela doutrina clássica, quais são as fontes do direito penal?
    • - Fonte material: União
    • - Fonte formal imediata: Lei.
    • - Fonte formal mediata: Princípios Gerais do Direito e Costumes.
    • Fonte material (fonte de produção ou de criação) se preocupa com o órgão encarregado da criação do Direito Penal. Em regra, somente a União está autorizada a criar o Direito Penal (art. 22 da CF). É competente de forma privativa (e não exclusiva) para elaboração da lei penal. Assim, a União poderá, por meio de lei complementar, autorizar os Estados-membros a legislar sobre questões específicas de interesse local (art. 22, p. único, da CF).
    • Fonte formal (veículos de revelação das normas penais) é o processo de exteriorização da fonte material. É meio de revelar o direito penal criado. É fonte de conhecimento.
  12. Pela doutrina moderna, quais são as fontes do direito penal?
    • - Fonte material: União
    • - Fonte formal imediata:
    • - Lei (única capaz de criar infração penal),
    • - CF,
    • - Tratado Internacional de Direitos Humanos
    • - Jurisprudência (ex.: art. 71, CP: “condição de tempo”, a jurisprudência diz que é de 30 dias)
    • - Complemento de norma penal em branco
    • - Princípios Gerais de Direito (o STF declara inconstitucionalidade de lei baseado em PGD)
    • - Fonte formal mediata: Doutrina
    • Obs: Costume é fonte informal de direito e PGD foram transferidos para fonte imediata.
    • Se o tratado internacional de direitos humanos foi ratificado antes da EC 45/2004, terá status de norma supra-legal. Se for ratificado depois da EC 45/2004 terá status de norma constitucional, desde que tenha quorum de EC (3/5 dos votos); e de norma supra-legal, quando aprovada por maioria simples.
    • O conceito de drogas tem previsão na portaria do SUS, que traz o rol das substâncias entorpecentes. Desse modo, se tem os atos administrativos como fonte formal imediata, já que, neste caso, são complementos de norma penal em branco.
  13. O que são costumes e quais suas espécies?
    • Costumes são comportamentos uniformes e constantes pela convicção de sua obrigatoriedade e necessidade jurídica.
    • Espécies de costume: incriminador, revogador (abolicionista) e interpretativo.
    • Não se admite o costume incriminador, pois somente lei cria crime e comina pena (princípio da legalidade) (art. 1º, CP).
  14. E quanto ao costume revogador?
    • No que tange ao costume revogador (abolicionista) há três correntes:
    • 1ª) É possível, aplicado nos casos em que a infração penal não mais contraria o interesse social. Para essa corrente, a contravenção penal de jogo do bicho foi revogada.
    • 2ª) Não existe costume abolicionista, mas quando o fato já não é mais indesejado pelo meio social, a lei não deve ser aplicada. Para essa corrente, a contravenção penal de jogo do bicho não foi revogada, mas não será aplicada.
    • 3ª) Não existe costume abolicionista. Enquanto não revogada por outra lei, a lei será aplicada. Para essa corrente o costume não revoga infração penal, tendo em vista que a LICC (aplicável ao Direito Penal) dispõe que uma lei terá vigor até que outra lei a modifique ou revogue (art. 2º). Essa corrente é a prevalecente
    • O adultério não é exemplo de costume que revogou a lei, pois foi revogado pela teoria penal de intervenção mínima.
  15. Os PGD podem ser incriminadores?
    Como ocorre com os costumes, os Princípios Gerais do Direito não podem ser fonte de norma incriminadora.
  16. Quais são os três enfoques da interpretação da lei penal e suas subdivisões?
    • A doutrina estuda a interpretação da lei penal sobre três enfoques: quanto ao sujeito, quanto ao modo, quanto ao resultado.
    • . Quanto ao sujeito (origem):
    • a) Autêntica (legislativa): a interpretação feita pela própria lei (ex: conceito de funcionário público previsto no art. 327 do CP).
    • b) Doutrinária ou científica: é a interpretação feita pelos estudiosos do direito.
    • c) Jurisprudencial: é fruto das decisões reiteradas de nossos tribunais. Em regra, não vincula, salvo as súmulas vinculantes.
    • A exposição de motivos do CP não é interpretação autêntica, pois não é dada pelo legislador, sendo realizada pelos doutos que ajudaram a elaborá-la. Assim, a exposição de motivos é uma interpretação doutrinária ou científica (Rogério Grecco e Flávio Monteiro de Barros).
    • Já a exposição de motivos do CPP é lei. Logo, trata-se de interpretação autêntica ou legislativa.
    • 3.2. Quanto ao modo:
    • a) Gramatical: quando leva em conta o sentido literal das palavras.
    • b) Teleológica: indaga-se a vontade ou intenção objetivada na lei.
    • c) Histórica: indaga-se a origem da lei (analisa-se os fatos sociais, as discussões no CN).
    • d) Sistemática: interpreta-se a lei considerando o sistema, ou seja, a lei é interpretada com o conjunto da legislação ou dos princípios gerais de direito.
    • e) Progressiva: interpreta-se a lei de acordo com o progresso da ciência.
    • O uso de um modo de interpretação não obsta que outro seja usado concomitantemente.
    • 3.3. Quanto ao resultado:
    • a) Declarativa: a letra da lei corresponde exatamente àquilo que o legislador quis dizer.
    • b) Extensiva: amplia-se o alcance da palavra do texto para se chegar até a vontade ou intenção do texto.
    • c) Restritiva: restringe-se o alcance da palavra do texto para se chegar a vontade ou intenção do texto.
  17. O Direito Penal brasileiro permite a interpretação extensiva contra o réu? Ex.: artigo 157, p. 2º, inc. I, do CP (roubo com emprego de “arma”).
    • 1ª) toma a expressão no sentido próprio. Assim, arma seria somente o instrumento fabricado com a finalidade bélica que sirva ao ataque. Faz, desta forma uma interpretação restritiva (no STF, Min. Peluzzo).
    • 2ª) toma a expressão no impróprio. No sentido impróprio, arma é todo instrumento com ou sem finalidade bélica, mas que serve ao ataque ou defesa. Faz uma interpretação extensiva. É a corrente prevalecente em nosso ordenamento jurídico.
    • Desse modo, no Brasil não se veda a interpretação extensiva contra o réu.
    • Observe-se, contudo, que o Estatuto de Roma, no seu art. 22, § 2º (norma supra-legal) proíbe a interpretação extensiva contra o réu.
  18. O que é intepretação analógica?
    • A interpretação extensiva não se confunde com a interpretação analógica, pois nesta o significado que se busca é extraído do próprio dispositivo, levando-se em conta as expressões genéricas e abertas utilizadas pelo legislador. Exs.: art. 121, § 2º, I, CP (“ou por outro motivo torpe”); art. 121, § 2º, III (“ou outro modo insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum”). Em ambos os exemplos dados, o legislador, por não conseguir prever todos os modos, exemplificou uma conduta e terminou os incisos com ordenamento genérico.
    • Também permite interpretação analógica o art. 306, CTB (“ou qualquer outra substância psicoativa).
  19. O que é analogia?
    As hipóteses de interpretação acima expostas (extensiva e analógica) não se confundem com a analogia. Nesse caso, ao contrário dos anteriores, partimos do pressuposto de que não existe uma lei a ser aplicada ao caso concreto, socorrendo-se daquilo que o legislador previr para outro similar.
  20. Quais as diferenças entre interepretação extensiva, interpretação analógica e analogia?
    • Interpretação extensiva
    • - Existe lei para o caso.
    • - Amplia-se o alcance de uma expressão ou palavra. Ex.: “arma”.
    • - Aplica-se em desfavor do réu.
    • Interpretação analógica
    • - Existe lei para o caso.
    • - O significado que se busca é extraído do próprio dispositivo que, depois de enunciar exemplos, encerra o texto de forma genérica, permitindo ao intérprete encontrar outros casos semelhantes. Ex.: art. 121, § 2º, I, III, IV, CP.
    • Analogia
    • - Não existe lei para o caso.
    • - O aplicador, na ausência de lei aplicável ao caso concreto, empresta outra norma criada para hipótese semelhante.
    • Obs.: A analogia é forma de integração.
    • - Não se aplica em desfavor do réu.
  21. Quais são os quatro grandes grupos em que se divide os princípio gerais do direito penal?
    • Divide-se em quatro grupos:
    • a) Princípios relacionados com a missão fundamental do Direito Penal.
    • b) Princípios relacionados com o fato do agente.
    • c) Princípios relacionados com o agente do fato.
    • d) Princípios relacionados com a pena.
  22. Quais são os Princípios relacionados com a missão fundamental do Direito Penal?
    • 4.1.1. Princípio da Exclusiva Proteção de Bens Jurídicos: impede que o Estado venha a utilizar o Direito Penal para a proteção de bens ilegítimos. Ex: não compete ao direito penal proteger uma religião, tendo em vista que o Estado é laico.
    • Um exemplo de desrespeito a este princípio foi o Estado Nazista.
    • 4.1.2. Princípio da Intervenção Mínima: o direito só deve ser aplicado quando estritamente necessário, mantendo-se subsidiário e fragmentário.
    • O direito penal não tem interesse em fatos da natureza, somente em fatos humanos. Ademais, não tem interesse em qualquer fato humano, apenas nos fatos humanos indesejáveis.
    • Como visto, o direito penal é um dos ramos voltados a garantir a pacificação social. Ou seja, serve como instrumento para inibir comportamentos humanos desviados ou indesejáveis. No entanto, em observância ao princípio da intervenção mínima, o direito penal somente esta legitimado a agir quando houver o fracasso dos demais ramos do direito, acrescido da relevante lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.
    • O princípio da intervenção mínima tem como característica a subsidiariedade e fragmentariedade. Ou seja, só deve intervir quando estritamente necessário, mantendo-se subsidiário e fragmentário.
    • No que tange à subsidiariedade, esta norteia a intervenção em abstrato, quando os demais ramos do direito fracassarem (ineficazes) no controle social. Deve ser a ultima ratio, derradeira trincheira no combate ao comportamento humano indesejado. O Direito Penal é subsidiário porque tem conseqüência jurídica mais drástica.
    • Com relação à fragmentariedade, ela norteia a intervenção no caso concreto. Assim, o Direito Penal somente intervém no caso concreto quando presente relevante e intolerável lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.
    • Exemplo dado por Rogério: Imagine todos os Direitos reunidos, com exceção do Direito Penal, com a finalidade de buscar a solução para a subtração de coisa alheia móvel. Neste caso, os outros ramos do direito são ineficazes, pois não possuem sanções capazes de inibir esta conduta. Em abstrato, o Direito Penal tipifica esta conduta como furto (é, então, subsidiário). Ocorre que diante do furto de uma caneta bic o Direito Penal não pode intervir no caso concreto. Ao selecionar a atuação no caso concreto, implicará a fragmentariedade.
    • O Princípio da Insignificância decorre da fragmentariedade, é desdobramento lógico desta.
    • Ressalte-se que o Princípio da Intervenção Mínima além de servir para dizer onde o direito deve intervir (ponto de vista positivo), serve também para dizer onde o direito penal não deve intervir (ponto de vista negativo). Ex.: adultério, sedução.
Author
carloselopes
ID
56532
Card Set
Direito Penal geral
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Perguntas sobre a aula 1
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